Entrevista com Constança Ferreira. A terapeuta que ajuda os pais a comunicarem com os bebés

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Entrevista com Constança Ferreira. A terapeuta que ajuda os pais a comunicarem com os bebés"

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Teve uma primeira bebé que chorava inconsolavelmente. Para o segundo filho, decidiu ler, investigar e perceber o porquê de os bebés chorarem sem razão aparente. Percebeu que entre mãe e


filho existe uma linguagem própria que tem de ser desenvolvida e agora serve de tradutora para quem ainda luta para perceber as necessidades dos bebés. Constança Ferreira começou por ajudar


as amigas e as amigas das amigas até que percebeu que precisava de um local para as mães recorrerem. Em 2014 abriu o Centro do Bebé, em Lisboa, e em 2015 lançou o livro “Os bebés também


querem dormir”, mas avisa que não se trata de um manual de instruções. “Um bebé não é um electrodoméstico”, refere.


Se a fralda está limpa e o biberão está dado, porque é que um bebé chora?


Em primeiro lugar, essa questão deve ser colocada ao pediatra para ver se há alguma razão do foro físico que possa estar a espoletar dor e desconforto. Com esse aspecto descartado, a


primeira causa para o choro do bebé nos primeiros três meses passa a ser a separação. Habituamo-nos a pensar no choro como um mecanismo ligado às necessidades reais como a fome, frio, calor,


a fralda suja, e vemos tudo o resto como vício, manha, capricho, necessidades secundárias. A verdade é que o bebé tem necessidade de estar no seu habitat natural, que é o corpo do cuidador.


O facto de um bebé chorar mais que outro tem também a ver com personalidade?


Somos todos diferentes e, não sei porquê, continuamos a pensar que os bebés não são pessoas. A mim, isso deixa-me perplexa. Pergunto muitas vezes aos pais: como foi o teu primeiro dia de


escola? É a mesma coisa. O bebé acabou de chegar ao mundo e cada um processa isso de maneira diferente.


A forma como a gravidez e o parto são vividos também influencia?


Há estudos que relacionam o stresse durante a gravidez com a forma como o bebé se desenvolve. Além disso, um parto traumático tem imenso impacto na forma como o pós-parto será vivido e até


na confiança da mãe para cuidar do bebé.


É formada em comunicação. De onde veio esse interesse pelas questões da maternidade?


Acaba por ser um trabalho de comunicação também (risos). A minha primeira filha chorava muito e, no meu segundo, quis estar mais bem preparada e comecei a pesquisar e a fazer formação. As


amigas começaram a pedir a minha ajuda, comecei a visitar muitas mães e, mais tarde, senti falta de um espaço físico para trabalhar e abri o Centro do Bebé, onde posso trabalhar em equipa


com profissionais de outras áreas, como enfermeiros e psicólogos.


No livro, começa por avisar que não é médica, nem psicóloga, nem enfermeira. Não acaba por ser um pouco destas três coisas?


Sou contra quem, sendo terapeuta numa área, se auto-intitule de especialista. As pessoas devem saber qual é o papel de cada profissional. A minha área de actuação é a do entendimento, de


descodificação do que o bebé quer dizer.


As mães chamam-lhe a “fada dos bebés”. O que faz é assim tão transcendente?


Isso teve a ver com o facto de eu não encontrar um nome para o meu trabalho.


Sim, digo que sou terapeuta de bebés. Há casos em que as mães me chegam já no limite e, quando começo a transformar o choro em palavras, parece magia. É o mesmo que acontece quando estou a


falar com alguém numa língua estrangeira e chega alguém que traduz. Há mães que chegam cá a achar que não sabem cuidar dos filhos e eu faço-as entender que têm esse superpoder de dar


resposta a tudo o que o bebé precisa.


A vinculação não é um momento, é um processo. Continuamos a achar que basta olhar para o bebé para ficar logo a pensar “eu amo-o” e nem sempre é assim.


Preparamo-nos para o pós-parto como quem se prepara para um projecto no trabalho. Há listas de coisas para comprar, livros para ler e esquecemo-nos de que o pós-parto é um encontro com o


lado mais primitivo que todos temos.


Digo sempre: qualquer coisa que falte, pode-se ir comprar à farmácia, mas o amadurecimento daquilo que vai ser o nosso lado mais escondido, esse deve ser pensado ainda na gravidez. Nós,


mulheres modernas e cheias de certezas, vamos ser confrontadas com a sensação de não saber o que fazer, e isso é novo para muitas de nós. Devemos deixar que isso venha ao de cima sem medo.


Toda a gente tem uma opinião sobre a maternidade. As mães devem evitar essas comparações?


Quando temos muitas vozes na cabeça, deixamos de ouvir a nossa. Temos de ter presente que o nosso bebé quer-nos a nós e mais nenhuma mãe. Eu demorei muito tempo a escrever este livro porque


não queria fazer um manual de instruções. Os bebés não são torradeiras, não são um electrodoméstico. Os palpites vêm porque os bebés são um bem colectivo e porque continuamos a achar que o


sono, a comida e os percentis são medalhas que as mães trazem ao peito. Extrapolar o que o nosso bebé atinge valida-nos enquanto mães.


Nove anos depois do nascimento da sua primeira filha, já percebe porque é que ela chorava tanto?


A insegurança dos pais potencia o não entendimento com o bebé?


A insegurança até pode ser positiva, porque nos faz pensar na melhor resposta a dar. Mas a ideia de insegurança associada a uma resposta certa ou errada é que já não é bom, porque aí estamos


associados a ideologias e a teorias. Seria mais fácil que, se um bebé chorasse, os pais simplesmente o acalmassem ao colo.


Claro que não. Os bebés humanos são das crias mamíferas mais imaturas e precisam de terminar a gestação fora do útero, nos braços dos cuidadores. O colo acalma, regula a temperatura, o ciclo


respiratório e cardíaco.


O contágio hormonal acontece, está provado que estar ao pé de alguém stressado activa os níveis de stresse. Basta um ritmo cardíaco mais acelerado para que o bebé perceba a diferença. Eu


aconselho as mães a falarem com os bebés e explicarem o que as preocupa. Não é científico, mas eu acredito que deixa o bebé mais descansado.


Deixar que o bebé chore para lhe darmos algo faz com que a comunicação seja feita à base do choro. Ainda temos a ideia de que o choro é a única forma de comunicação de um bebé, e isso é


mentira. O choro é o SOS, é a comunicação tardia. Quando o bebé já está na zona vermelha, as várias tentativas de acalmia, às vezes, resultam ao contrário. Passar de colo em colo, ir à


janela ver os carros, ligar a televisão ou o bonequinho com música vão estimular um bebé que já está estimulado.


O contacto físico é essencial. O bebé deve ser embalado e sem estímulos no espaço visual. Estar à frente de uma parede branca, por exemplo, ajuda.


Não, porque nunca faço igual. Fruto da experiência, espero que seja o bebé a mostrar do que precisa e acabo por adaptar as técnicas a cada caso.


Porque confundimos instinto e intuição. O instinto é aquilo que temos de mais primitivo, é o olhar para o bebé e perceber que se passa alguma coisa. A intuição é mais natural para algumas


mães, mas tem a ver com a forma como se prepararam para a maternidade.


A intuição e a confiança podem sempre ser desenvolvidas. Há muita coisa que os pais vão fazer errado, mas é nessas tentativas que se vai conhecendo mais o bebé.


Acha que os cursos de preparação para a maternidade deviam ser mais utilizados?


Há um acesso cada vez maior a esse tipo de cursos, existem até nos centros de saúde. Mas acho que falta conhecimento geral sobre os bebés. Ainda os vemos como um incómodo social, isso é um


absurdo.


Mas não acha que ainda há preconceito sobre esse tipo de cursos?


Isso tem a ver com o facto de serem um fenómeno da última década com o qual as nossas mães e avós não lidaram. A preparação para o parto fazia-se desde a infância, vivíamos em comunidade e


toda a gente tinha contacto com irmãos, primos, sobrinhos, etc. Deixámos de viver em comunidade e passámos a viver em gavetas, e isso fez com que muitos casais nunca tenham lidado com um


recém-nascido até ter o seu próprio filho. Não podemos é ter a arrogância de pensar que um curso substitui uma avó.


Nos novos conceitos familiares, actualmente temos uma mãe, um pai e um bebé. Não ter o pai nesta equação é impensável. Pensar que o pai dá uma ajuda é giro, mas não é suficiente. O pai é um


cuidador de pleno direito.


Já começa a dar-se mais importância ao contacto entre mãe e bebé logo após o nascimento. Se não houver problemas de saúde, não há razão para que sejam afastados. Está provado que os bebés


que têm um contacto imediato com a mãe são bebés com mais facilidade na amamentação e as mães sentem-se mais seguras no seu cuidado.


Os primeiros dois anos são fundamentais. Não digo para os pais ficarem sem trabalhar durante dois anos, mas a protecção à presença do pai e da mãe durante a primeira infância devia ser


repensada. Nenhum pai é feliz ao deixar o filho na creche às 7 da manhã e ir buscá-lo às 19h.


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