O Senado desmoralizado

_A volta de Renan Calheiros à presidência do Senado será um novo golpe duro na reputação – já muito abalada – da Casa_ Um misto de estupefação e revolta é o sentimento que importuna a cabeça

dos brasileiros nestes poucos dias que antecedem as eleições para as presidências do Senado e da Câmara Federal. Protegidos pelos interesses do Planalto, pelo fisiologismo escancarado de

seus pares e pela impotência dos minguados redutos da oposição, dois dos políticos mais afamados dos últimos tempos quando se trata de quebrar a ética são os mais cotados para assumir os

dois mais elevados cargos do Congresso Nacional. De Henrique Alves, candidato favorito à presidência da Câmara, esta Gazeta do Povo tratou ontem, neste mesmo espaço. No Senado, prevê-se a

volta "triunfal" do peemedebista alagoano Renan Calheiros à presidência da Casa – posto do qual, em 2007, fora apeado quando se tornou pública uma artimanha de sua autoria, pela

qual uma empreiteira se encarregava de pagar a pensão alimentícia à namorada com que o senador tivera um filho em relação extraconjugal. Tantas foram as denúncias contra sua conduta pública

– históricas algumas, pois se acumulavam desde os tempos em que figurava como um dos condestáveis da era Collor – que a Renan não restou alternativa senão a de renunciar ao mandato para não

sofrer cassação. Voltou, porém, ao Senado, "nos braços do povo", ao ganhar nova eleição em Alagoas em 2010. Imaginava-se que, tendo aprendido a lição, mantivesse no novo mandato

postura humilde e se recolhesse ao discreto cumprimento das obrigações parlamentares mais básicas. Entretanto, não tardou a recuperar o velho brilho como eficiente e acatado articulador

político. Culpa dele? Não. Culpa da maioria de seus pares, sempre mais disposta a se curvar diante dos que demonstram mais desassombro e influência do que manter-se comprometida com valores

éticos, morais e políticos mais elevados. Resulta desse comportamento de subserviência sem olhar a quem a preferência da maioria dos senadores para devolver a ele o comando da Casa, a

presidência do Congresso e a terceira posição na hierarquia para, em momentos de transição, investir-se também da própria Presidência da República. Aliás, foi num desses recentes momentos de

transição causada por uma viagem de Dilma Rousseff ao exterior que o veterano e igualmente famoso senador José Sarney, na condição de presidente do Senado, voltou a presidir o país por

alguns dias. O Brasil corre o risco de ver Calheiros na mesma posição. Ensaia-se alguma resistência à eleição de Renan Calheiros. O nanico PSol lança para o enfrentamento seu único

representante, o senador Randolfe Rodrigues, do Amapá. O matogrossense Pedro Taques (PDT) é outro que se apresenta. Nenhum dos dois empolga os colegas, nem mesmo os das mais numerosas

bancadas de oposição (PSDB e DEM), que buscam apoiar os "independentes" peemedebistas Pedro Simon e Jarbas Vasconcelos. Sabem todos, porém, que tudo não passará de mera figuração –

ainda assim, porém, necessária à manutenção das aparências de democracia. Triste país é este que se vê escravo de políticos e métodos que entregam suas instituições mais importantes ao

mando dos mais inescrupulosos e dos mais incapazes. Ou, pior, dos mais capazes de tudo. Olhando apenas alguns meses para trás, quando o STF julgou e condenou mensaleiros, vê-se que a

esperança de que o Brasil caminhava em direção a dias melhores pode não passar de um espasmo.