Justiça não é brinquedo

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A recente viralização de um vídeo em que uma advogada relata ter sido procurada para ajuizar um pedido de guarda de um “bebê reborn” – boneca de silicone hiper-realista – não é apenas mais


uma anedota do chamado “entretenimento jurídico”. É um sintoma alarmante da corrosão do Direito e da jurisdição enquanto espaços de resolução séria e legítima de conflitos. Segundo a própria


narrativa, a profissional recusou a demanda, como não poderia deixar de ser. E decidiu compartilhá-la publicamente, indicando o limite do absurdo que lhe foi apresentado. A reação foi


previsível: curiosidade, memes, piadas – e pouquíssima crítica. É preciso dizer com todas as letras: o Direito não é lugar de fantasia. O Poder Judiciário não é palco de teatro. E a


advocacia não pode ser instrumento de promoção da irracionalidade (e da irresponsabilidade) jurídica alheia. Em um país com quase 80 milhões de processos em curso e um tempo médio de sete


anos para um desfecho definitivo, a mera cogitação de demandas desse tipo exige uma resposta à altura – firme, técnica e ética. O mais grave não está na figura excêntrica que quer “litigar”


por uma boneca. Está na forma como a sociedade (e parte da comunidade jurídica) reage: rindo, curtindo, comentando, engajando, tratando como curiosidade (ou loucura) inofensiva. Não é. Ao


tornar públicas essas abordagens sem o devido contexto crítico, reforça-se a falsa ideia de que qualquer desejo pode se transformar em direito — e que o advogado seria mero operador da


vontade do cliente. Não é assim. Advogar é, antes de tudo, filtrar, orientar, recusar. É responsabilidade, e não espetáculo. Há, inclusive, um ponto adicional que parece ter surgido nesse


caso e que revela outra distorção jurídica relevante: a disputa sobre a titularidade da conta da boneca nas redes sociais. Neste aspecto, convém separar as esferas com precisão. A conta em


si — com número de seguidores, monetização, contratos de publicidade e conteúdo autoral — pode ser, sim, considerada um ativo digital. E, como tal, deve ser tratado como bem partilhável,


sujeito às regras da comunhão ou dissolução da sociedade conjugal, empresarial ou afetiva eventualmente existente entre as partes. Mas isso nada tem a ver com afeto projetado sobre a boneca.


É uma questão de patrimônio, não de parentalidade. Confundir essas instâncias — emoção, identidade, posse, patrimônio e tutela jurídica — é não apenas conceitualmente equivocado. É um risco


institucional. A Justiça não é um lugar de acolhimento indiscriminado de toda dor subjetiva. É um espaço técnico para a resolução de litígios que envolvam interesses juridicamente


tuteláveis. E isso exige discernimento. Nem toda dor vira direito. Nem todo conflito merece ação. Às vezes, é o afeto que precisa de cuidado — não o processo. Enquanto tratarmos o Judiciário


como balcão de desejos ou palco de performances emocionais, não haverá celeridade, nem eficiência, nem dignidade. A solução de disputas — seja por mediação, negociação ou judicialização — é


pilar da democracia. Exige preparo, sobriedade, responsabilidade. Porque quando o Direito vira meme, a Justiça vira piada — e o pacto civilizatório que a sustenta começa a ruir. E, ao


final, todos nós perdemos.


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